A expectativa manteve-se ao último minuto. Só quando Maria Luís Albuquerque chegou à porta do hotel Sol e Serra, em Castelo de Vide, é que o suspense em torno da sua presença na Universidade de Verão do PSD foi desfeito. Sem declarações aos jornalistas, a ex-ministra das Finanças de Passos Coelho, e o nome escolhido por Luís Montenegro para representar Portugal na Comissão Europeia, deixou algumas pistas sobre a sua visão sobre o projecto europeu e admitiu que tem uma “preferência” por uma pasta concreta, mas não a quis revelar. “Espero que a minha experiência como ministra das Finanças me ajude a ultrapassar tempos difíceis como aqueles que ultrapassámos”, acrescentaria.
Aliás, a antiga governante não resistiu em defender as opções do executivo que integrou, sacudido a imagem negativa colada pela troika e sendo peremptória sobre a que diz ser a avaliação dos portugueses: “O país reconheceu o legado de Passos Coelho: nós ganhámos as eleições em 2015”. A observação da ex-governante animou a sala e valeu o mais longo aplauso da noite.
Num discurso que durou cerca de 20 minutos, e que foi seguido por uma sessão de perguntas e respostas às questões dos jovens alunos da Universidade de Verão do PSD, Maria Luís Albuquerque contou até as medalhas que os 27 Estados-membros da União Europeia (UE) trouxeram dos últimos Jogos Olímpicos, em Paris (“mais do que os EUA e a China juntos”), e insistiu que é preciso “pensar na União Europeia como um bloco”.
Uma UE mais diversa e fragmentada
Notando que a UE mudou e que “há muitas coisas que antes eram pensadas [como sendo] impossíveis e que agora se fizeram”, a ex-ministra das Finanças avisou que os próximos anos “não serão fáceis” e é preciso “ter uma Europa preparada para agir e não [para] reagir”. É que “se os últimos cinco anos foram muito difíceis com a pandemia e invasão da Ucrânia, os próximos anos não serão mais fáceis”, notou. É preciso preparar a UE para “saber superar os desafios de um mundo menos previsível e estável”.
Insistindo no projecto europeu como um “colectivo”, vincou ainda que a Comissão Europeia é igualmente representada por cada país. “Cada país tem um comissário. Todos são iguais”, declarou. Mas fez uma ressalva: “Um comissário europeu não é um representante de um país, é representante da pasta que tutela.”
A ex-governante antecipa que os próximos anos tragam cada vez mais dificuldades em “concordar nos principais problemas” e na “hierarquização de prioridades”, uma vez que a realidade da União Europeia é “cada vez mais diversa”.
E embora garanta que os “objectivos ambiciosos” para a descarbonização são para manter, disse estar preocupada em garantir a capacidade de responder à “concorrência global”.
A ex-ministra das Finanças assinalou ainda a sua preocupação com o envelhecimento demográfico, mas pede que as soluções não ponham “em causa os valores europeus”, a “liberdade e o respeito pela dignidade humana”.
“O que todos queremos na Europa é viver melhor”, sintetizou. Para Albuquerque, “o que se faz melhor a nível europeu, deve ser feito a nível europeu e o que se faz melhor a nível nacional deve ser feito a esse nível”.
Naquela que foi a sua primeira presença pública depois da sua indigitação, Albuquerque afirmou que era preciso “valorizar a pertença à Nato”. “Temos de caminhar para garantir que nos conseguimos defender”, sublinhou, defendendo que um dos caminhos será através da “reabilitação da indústria de defesa na Europa”. A ex-governante quer também mais empresas a concorrer “na área da tecnologia”, nomeadamente no sector da Inteligência Artificial.
À chegada a Castelo de Vide, foi recebida pelo director da Universidade de Verão, o antigo eurodeputado Carlos Coelho, e pela ministra da Juventude Margarida Balseiro Lopes e não respondeu a perguntas da comunicação social.
Costa deixou recados
Horas antes de Maria Luís Albuquerque subir ao palco, a ex-ministra das Finanças recebeu as “maiores felicidades” do ex-primeiro-ministro, António Costa. À chegada à Academia Socialista, onde foi o orador da noite, Costa não quis comentar que pastas gostaria de ver nas mãos de Portugal. E embora não tenha voltado a falar no nome de Maria Luís Albuquerque, deixou-lhe alguns recados, notando que a União Europeia agora prefere uma resposta “de solidariedade” no lugar de “austeridade” – uma nota que Albuquerque reconheceria na sua intervenção.
Agora, apresentados todos os possíveis membros da próxima Comissão Europeia, caberá à presidente, Ursula von der Leyen, a escolha e atribuição das diferentes pastas. Depois, entre Setembro e Outubro, haverá audições públicas no Parlamento Europeu aos nomes propostos para novos comissários europeus. Só depois a nova Comissão Europeia poderá tomar posse, o que se espera que aconteça até final do ano.
Segundo a agência Lusa, a liderança do Conselho Europeu por António Costa, a partir de Dezembro, não deverá implicar a atribuição a Portugal de uma pasta de menor importância na próxima Comissão Europeia.