Eventos climáticos extremos, como incêndios, inundações, ondas de calor e secas, representam um risco crescente para a cadeia de abastecimento de alimentos do Canadá, pressionando os preços até as prateleiras dos supermercados, dizem especialistas.
“Sempre que há grandes eventos climáticos, isso tende a aumentar os custos”, disse Frank Scali, vice-presidente de assuntos da indústria na Food, Health & Consumer Products Of Canada.
Esses tipos de eventos estão se tornando mais frequentes e intensos no Canadá e no mundo todo.
Um relatório do governo federal de 2019 afirmou que as temperaturas devem continuar aumentando, impulsionadas pela influência humana, enquanto a precipitação também deve aumentar.
O clima desempenha um papel importante na produção de alimentos, e fatores como muito ou pouco calor ou umidade podem afetar não apenas o volume de alimentos produzidos, mas também a prevalência de pragas e doenças, disse Amanda Norris, economista sênior da Farm Credit Canada.
“O clima também pode impactar atividades mais abaixo na cadeia de suprimentos”, ela disse. “Por exemplo, você pode ter infraestrutura danificada por inundações que mudam as rotas de transporte e a capacidade de mover esses produtos ao longo da cadeia de suprimentos de alimentos.”
A escassez causada por condições climáticas extremas também pode elevar os preços dos alimentos se a oferta não for capaz de atender à demanda, disse ela.
De acordo com um relatório de julho do Instituto Canadense de Política Agroalimentar, a indústria agrícola enfrentou uma “cascata de desafios” recentemente, incluindo as mudanças climáticas, com os efeitos cascata desses ventos contrários reverberando por toda a cadeia de suprimentos.
Em uma pesquisa para o relatório, entrevistados da indústria e membros do governo identificaram condições climáticas extremas como um dos maiores riscos para o setor agrícola.
Grandes inundações na Colúmbia Britânica há três anos atingiram duramente os fazendeiros, com centenas de milhares de galinhas e outros animais de fazenda morrendo depois que rios atmosféricos causaram inundações e deslizamentos de terra.
A seca em 2023 prejudicou a produção agrícola em Saskatchewan, com queda de quase 11% na produção, dois anos após um declínio histórico de 47% na produção devido ao calor extremo e à seca em 2021.
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A indústria agrícola conseguiu se tornar um pouco mais resiliente a coisas como a seca ao mudar algumas de suas práticas, disse Tyler McCann, diretor administrativo do instituto de política agroalimentar, como usar uma técnica de plantio direto para manter mais umidade na terra. Essas práticas não podem proteger as plantações do clima mais extremo, disse ele, mas ajudam em outros anos.
Condições climáticas extremas em outras partes do mundo também podem afetar os agricultores se os custos dos insumos, como fertilizantes, aumentarem, ou se houver escassez de uma safra importante que cause estragos nos preços das commodities, disse McCann.
“Um evento climático extremo na China ou na Índia no momento errado pode levar a consequências bastante significativas e devastadoras, porque realmente não há trigo suficiente no resto do mundo para compensar as perdas potenciais”, disse ele.
Embora os agricultores frequentemente vejam impactos diretos de eventos climáticos extremos, para aqueles que estão mais adiante na cadeia de suprimentos, como fabricantes e processadores, os efeitos geralmente são indiretos, disse Scali.
As cadeias de suprimentos são geralmente projetadas para manter o menor custo em mente, o que significa que o risco de interrupção é maior, ele disse, como ter uma grande fábrica em vez de várias menores, ou depender de uma única fonte para um insumo importante. Uma interrupção em uma parte da cadeia de suprimentos pode criar um “efeito dominó”, ele disse.
No entanto, a pandemia da COVID-19 e os emaranhados resultantes na cadeia de suprimentos mostraram às empresas que, às vezes, a opção de menor custo é muito arriscada, disse Scali. Muitas empresas mapearam suas cadeias de suprimentos, recorrendo a várias fontes para insumos ou identificando backups.
“Isso realmente colocou todos um passo à frente”, disse ele.
Mas esses tipos de mudanças não podem mitigar todas as possíveis interrupções, disse Scali, e a escassez e a volatilidade dos preços provavelmente piorarão.
Condições climáticas extremas não afetam apenas as commodities em si, mas também podem interromper o transporte.
Os incêndios no oeste do Canadá são o exemplo mais recente, disse Scali, onde linhas ferroviárias foram fechadas.
“Sim, você pode colocar coisas em caminhões, mas nunca há capacidade de caminhões suficiente no país para compensar a ferrovia. Então as coisas vão atrasar, e vai ficar mais caro”, ele disse.
Se for uma interrupção única, a empresa geralmente tenta absorvê-la, disse ele, mas interrupções ou mudanças de longo prazo geralmente significam que os preços terão que subir.
Os canadenses podem perceber os efeitos de eventos climáticos extremos em seus alimentos de duas maneiras: quando os preços sobem e quando os itens repentinamente não ficam mais disponíveis.
Em novembro de 2022, os preços da alface dispararam em meio à escassez de alface americana e romana, atribuída a um vírus em uma grande área de cultivo de alface na Califórnia. Na primavera seguinte, o vale foi atingido por fortes chuvas e tempestades, causando inundações.
No início deste ano, a alta nos preços futuros do cacau destacou os efeitos das altas temperaturas, condições climáticas e doenças na África Ocidental, onde a produtividade das colheitas foi prejudicada.
Os preços do suco de laranja tiveram um aumento semelhante nesta primavera, já que inundações e secas prejudicaram as colheitas no Brasil, um ano depois de a Espanha e a Flórida terem sofrido queda na produção de laranjas em meio à seca e ao furacão Ian, respectivamente.
Morangos também correm risco. De acordo com a Universidade de Waterloo, as frutas devem se tornar mais raras e caras conforme as temperaturas sobem. Ela observou que o Canadá é um grande importador de morangos da Califórnia.
Este ano, muitas das categorias de alimentos que apresentaram volatilidade nos últimos anos se estabilizaram, disse Michelle Wasylyshen, porta-voz do Retail Council of Canada, em um e-mail. No entanto, o calor extremo atual no oeste do Canadá e nos EUA pode afetar alguns preços no outono e no inverno, disse ela.
Conflitos geopolíticos se somam à mistura, ela disse. “O conflito em andamento na Ucrânia nos tornou mais dependentes dos grãos canadenses, então, quando isso é impactado por clima extremo, tem um impacto maior do que antes.”
— Com arquivos da The Associated Press
