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No mundo do samba, a voz masculina ainda fala mais alto. Seja no palco, seja nos bastidores, o machismo prevalece. Mas, no que depender de Babi Cruz, 53 anos, esse domínio está com os dias contados. “As mulheres devem se unir e ocupar o espaço que merecem. O samba também é lugar para mulheres, não está reservado só aos homens”, afirma. Babi acredita ter autoridade para tocar nesse assunto: “Nasci no samba, cresci no samba, me casei com o samba e pari dois sambistas maravilhosos,” afirma, durante passagem por Lisboa.
Babi não quer ver o seu papel no samba se resumir ao de esposa de Arlindo Cruzum ícone que está afastado dos palcos há anos devido a um AVC (Acidente Vascular Cerebral). “Nós, mulheres, somos uma potência. Fomos ensinadas a ter uma disputa particular. Não pode todo o nosso potencial ser usado em benefício dos homens, para torná-los mais fortes. Temos de usar a nossa capacidade para abrir portas para nós”, diz.
Cantora e compositora, Babi descreve seu peso no samba: “Desbravei alguns papéis importantes no carnaval do Rio de Janeiro. Fui a primeira criança a ter autorização do juizado de menores para desfilar à frente da bateria da Mocidade Independente de Padre Miguel. Comecei como porta-bandeira aos 12 anos”. Aos 22, passou a carregar a bandeira da sua escola de samba profissionalmente, sempre compondo e cantando.
Arlindo Cruz entrou na vida de Babi ainda na juventude dela. “Quando começamos a namorar, quem estava nos palcos era eu com a inesquecível Beth Carvalho. Se hoje me conhecem como a esposa do Arlindo, à época, ele era o namorado da Babi”, conta. Os dois se casaram de maio de 2012, depois de um longo noivado, que começou em 1986.
Múltiplos papéis
Durante nove anos, ela cuidou da carreira do sambista com uma dedicação que ia além das funções tradicionais. “Fazia o que ele precisasse. Se estivesse à procura de uma figurinista, lá estava eu. Se precisasse de uma produtora, lá estava eu. Se necessitasse de uma vocal de apoiotambém estava lá”, relembra. Diz mais: “Participei da criação de várias canções do Arlindo, algumas, eu compus com ele, em outras, estive na produção, arregimentando músicos, escolhendo cenários”, ressalta.
Mesmo nas negociações das obras de Arlindo com as gravadoras, muitas vezes, Babi tomou à frente. Ela relembra, particularmente, uma reunião tensa com a Sony Music. “Nesse dia, estava tão nervosa. O pneu do meu carro furou, perdi minha carteira de documentos, mas não esmoreci”, enfatiza. Diante dos diretores da empresa, não se fez de rogada. “Disse: não sei nada. Tudo que sei é que quero aprender”. A conversa com o presidente da empresa se deu por meio de um comprimidoque traduzia o que ambos falavam. Ela, em português, ele, em inglês.
Mãe e artista
A conciliação entre a carreira dela, a carreira do marido e a maternidade foi outro desafio significativo para Babi. “Muitas vezes, enquanto empresária, preparava a turnê do Arlindo e não podia acompanhá-lo nas viagens porque tinha que ficar com os filhos, que estavam na escola. Nós, que somos do subúrbio carioca, temos aquelas famílias tradicionais, e não gostamos de deixar nossos filhos com uma babá”, assinala.
Atualmente, Babi está envolvida com um novo projeto, intitulado A Profecia do Poetaque deve fazer carreira pela Europa. “Nós iremos até Paris, arrasar no Olympia. O mostrar tem de continuar”, diz. Para a cantora e compositora, o samba é muito mais do que música, é uma expressão de cultura, resistência e paixão. E também um espaço de mulheres que vivem da música.