O Comité Olímpico Internacional não tem limites


1. E os países árabes também não (e o petróleo?). Com efeito, a recente sessão plenária, realizada em Paris, do Comité Olímpico Internacional (COI), veio a aprovar, por unanimidade, a realização dos Jogos Olímpicos Electrónicos, ou, dito de outra forma, dos Olympic Esports Games. Como afirmado pelos responsáveis do COI, trata-se de entrar numa outra era, caminhando com o sentido dos tempos modernos, em que os esports — referência aqui usada por mera simplicidade de escrita — são uma realidade omnipresente, ainda dotada de um grau de crescimento impressionante, movendo ainda milhões e milhões de dólares (ou euros).

2. Este passo vem no seguimento de todo um procedimento do COI, desde a negação ao estado actual, passando pelo incentivar das federações desportivas internacionais a integrarem as modalidades desportivas em modo virtual, tais como o futebol, ténis, basquetebol ou o automobilismo. Disso nos ocupámos aqui, com um texto intitulado “O 2 de Julho de 2024 e o novo ‘desporto’”, publicado a 5 de Julho, a propósito de uma conferência parlamentar organizada pelo Partido Socialista sobre a temática dos esports. Em particular, no nosso caso, sobre a sua regulação, a nível internacional e nacional.

3. A responsabilidade pela organização foi endereçada, pelo COI, à Arábia Saudita (ao seu Comité Olímpico), por um período de 12 anos (!!), estando prevista a realização da primeira edição já em 2025. Muitos aspectos encontram-se ainda em aberto ou, pelo menos, não são públicos. Serão três edições ou serão realizados de dois em dois anos? Que jogos serão recolhidos e afastados do programa olímpico?

Neste último aspecto, o COI vem sempre afirmando que estarão de fora os jogos que envolvam uma “violência visível” com a utilização de armas. A ver vamos.

4. Não colocando em crise o evento em perspectiva, não podemos deixar de frisar que não são conhecidos os valores — por certo nada diminutos — que estão em jogo e os proveitos que daí reverterão para essa entidade sem fins lucrativos, o Comité Olímpico Internacional.

Por outro lado, esta decisão atípica de atribuição à Arábia Saudita, sem o surgir das habituais candidaturas “a concurso”, deixa muito espaço nubloso. E, mais uma vez, representa uma afirmação de um país árabe do petróleo, naquilo que muitos entendem ser uma forma de sportswash, agora, em bom rigor de conceitos, “esportswashing”.

5. Relembrando o “testamento” de José Manuel Constantino (entrevista na revista Visão de 25 de Julho passado): “O olimpismo é hoje um negócio puro e duro, vendido aos patrocinadores, com muito dinheiro distribuído pelos comités olímpicos nacionais, e, portanto, está completamente subjugado ao neoliberalismo e ao negócio. E o exemplo mais gritante disto é essa ideia peregrina de integrar os desportos electrónicos no sistema das práticas desportivas. Não há outra razão, que ajude a explicar esta circunstância, que não seja o negócio”.



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