‘O luxo hoje é uma experiência’, diz Diana Verde Nieto, especialista em práticas conscientes na moda


Trabalhando no mercado de luxo, a britânica esteve no Brasil para falar sobre a visão das novas gerações em torno do tema

Dias antes da Semana de Moda de Pariso evento mais aguardado pelo mercado de moda de luxo do mundo, uma visitante inglesa chegou a São Paulo com a proposta de reimaginar esse glamouroso e disputado mercado. Com 20 anos de experiência, Diana Verde Nieto é especialista em práticas ecologicamente conscientes em grandes instituições. Seu currículo inclui trabalhos com nomes como o do ex-vice-presidente dos EUA Al Gorepassagem pelo Departamento de Assuntos Econômicos e Sociais da ONU e atuação em grandes empresas multinacionais, como o grupo LVMH. Em janeiro deste ano, Verde lançou, em Londres, o livro Reimaginando o luxo, Reimaginando o Luxo em tradução livre. Para a estudiosa, que esteve no Brasil na última terça-feira, 17, a convite de Caroline Putnoki, no evento France Excellence, dedicado à abordagem do luxo francês ligado à cultura do país, a reinvenção do mercado passa pela inovação e pelo uso de novas tecnologias. Passa também pela ressignificação desta palavra, que nos últimos anos passou a ser mal interpretada, pois tem um sentido diferente para a geração Z.

Segundo estimativas de empresas de pesquisa como Bain & Company e Euromonitor International, a França é responsável por cerca de 30% do capital movimentado mundialmente pelo mercado de moda de luxoque gira em torno de 1,5 trilhão de euros a cada ano. O valor expressivo demonstra o enorme volume de produtos lançados e, consequentemente, os altos custos para o meio ambiente. Mas, de acordo com Diana – que fala sobre o assunto com base em conversas com executivos da área, pesquisas e análises -, isso parece estar em curso de mudança. “O luxo é frequentemente associado à opulência e ao excesso. Mas esses conceitos têm evoluído com os tempos e, em 2024, isso já não é mais verdade. A palavra ‘luxo’ também traz a ideia de algo que está preso no tempo, que não busca inovações e que não é progressivo. Isso também é um equívoco”, explica. “O luxo de hoje dança entre paradoxos: de um lado, você tem a modernidade e a inovação; de outro, a herança e a história de cada marca”. Ambos são conceitos fundamentais para o olhar proposto pela especialista, que conclui: “Hoje em dia, eles são coreografados perfeitamente, de uma maneira em que é possível vivenciá-los sem opulência”.

Dessa dança metafórica à qual Verde se refere, surgem abordagens que, apesar de diferentes, se alinham perfeitamente com a ideia de um luxo mais sustentável. “A tradição e a história que as grandes marcas deste mercado carregam ao longo do tempo se materializam em produtos que trazem ao presente sua expertise tradicional e que se conectam a valores associados à qualidade e durabilidade. Esses predicados são atemporais e vêm como consequência da construção habilidosa e do pensamento cuidadoso que estão por trás de cada criação. Com isso, um valor secundário, ligado à sustentabilidade, entra em pauta: a habilidade de o produto ser passado para outras gerações”, detalha Diana, em uma linha de pensamento que sugere um olhar para o luxo com foco em produtos que não se prendem a uma só temporada e que, por consequência, geram menos descartes e fazem melhor uso dos recursos necessários para sua produção. “Quando uma marca de luxo produz algo, isso dura por muito tempo. O design para obsolescência não é mais uma opção; a durabilidade e a transparência estão no topo da agenda do luxo em 2025?, conclui.

O foco em qualidade, em vez de quantidade, abrange o estilo de vida que Diana credita às novas gerações Z e Alpha, que, como ela mesma define, priorizam ao máximo o joie de vivre, termo em francês para a alegria de viver. “Eles não vivem para trabalhar; trabalham para viver. Não vivem para comer; comem para viver… “Eles querem trabalhar, sim, mas querem viver, se divertir, ajudar uns aos outros e ter experiências”. Nesta linha de pensamento, o luxo opulento, que fazia sentido para os Boomers [nascidos entre 1946 e 1964]que estavam em busca de segurança adquirindo o máximo de recursos em um período pós-guerra, não faz mais sentido”.

Além de valorizar a qualidade, as novas gerações também buscam experiências. Isso pauta outra reinvenção: as ações estratégicas que as marcas têm realizado cada vez mais, com foco em vivências que vão além do produto. “As marcas de luxo foram muito bem-sucedidas na democratização deste mercado. Fizeram isso a partir do entendimento de que o luxo não está limitado a uma coisa ou só um produto físico; o luxo hoje é uma experiência”, pontua a especialista. “A LVMH [maior holding de marcas de luxo do mundo] faz isso muito bem. O patrocínio aos Jogos Olímpicos de 2024 foi brilhante. Foi a democratização suprema do luxo, pois todos puderam aproveitar. O preço do item em si, o produto de luxo, se mantém, mas a experiência é para todos”, exemplifica. A autora continua e cita também os cafés que marcas como Prada e Fendi abriram, criando um novo ponto de contato com a marca. Ela vai além, e conclui falando sobre museus e outras instituições: “Quando você pensa no portfólio da LVMH, você tem, por exemplo, o Jardin d’Acclimatation, em Paris, e a Fondation Louis Vuitton, que é uma experiência gratuita em alguns momentos. Você pode ter a vivência e o conceito, seja pagando milhares de dólares ou nada”.



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