A sustentabilidade ambiental tornou-se essencial para a reputação das empresas e os critérios ESG (sigla para critérios ambientais, sociais e de administração) permitem avaliar o impacto e os resultados de forma mais rigorosa. No seio do debate no 1.º de três Encontros com Futuro, iniciativa do PÚBLICO apoiada pela REN, ficou claro que a adopção de práticas sustentáveis é cada vez mais relevante para demonstrar a responsabilidade das empresas e garantir o compromisso com o meio ambiente, a sociedade e as práticas de boa gestão – mas ainda há muito para explorar.
Um processo gradual de adaptação
Um breve resumo do que foram as principais conclusões no ano anterior marcou o arranque da 2.ª edição dos Encontros com Futuro: no que respeita à implementação de critérios ESG na sua gestão, as empresas estavam ainda a adaptar-se ao novo paradigma. A antecipação do que esperar, no âmbito da sustentabilidade, e que estratégias implementar foram alguns dos temas discutidos nesta primeira sessão. Opinião consensual foi a de que a adopção de práticas mais amigas do ambiente se reflecte nos resultados e reputação das organizações, mas é importante também que a dimensão social não seja descurada, mesmo que apresente maiores riscos.
Coube à anfitriã Fernanda Freitas fazer o ponto de situação. Referiu também, relevante para as intervenções que se seguiram, o estudo do BCSD Portugal que analisou a maturidade em sustentabilidade de 67 empresas portuguesas, incluindo grandes empresas, PME (pequenas e médias empresas) e microempresas. O relatório, publicado em 2023, mostrou que há um crescente compromisso com os critérios ESG e com a Agenda 2030 (uma agenda alargada, definida pelas Nações Unidas, que aborda várias dimensões do desenvolvimento sustentável e onde se incluem os 17 Objectivos de Desenvolvimento Sustentável).
Num comentário alargado, Pedro Cruz, coordenador e parceiro ESG da KPMG, começou por lembrar que, apesar de uma avaliação tendencialmente positiva do grau de preparação das empresas nesta área, “o desafio é grande para a maior parte das empresas” – e 80% do tecido empresarial português é composto por PME. Ainda em 2024, a publicação de um novo reporte neste âmbito irá permitir, acredita, “um novo escrutínio e a comparabilidade de critérios facilitada”.
No que concerne às preocupações das administrações das empresas, embora aumentar o investimento seja uma realidade, a capacitação das equipas é necessária e urgente – até para dar resposta a clientes e a instituições financeiras. A marcar o comentário de Pedro Cruz, uma preocupação comum: “a capacidade de [as empresas] continuarem a ser financeiramente sustentáveis.” Neste ponto, a questão do “custo-conformidade”, ou seja, das despesas associadas ao cumprimento da nova regulamentação prevista, é motivo de um certo desconforto. Apela-se, por isso, ao bom senso e ponderação das entidades que vão avaliar o estado da arte do ESG em Portugal – “um tema que marca a agenda, inevitavelmente”, assegura Pedro Cruz. Assunto sobre o qual “as oportunidades que existem são, provavelmente, maiores do que os custos em que podem incorrer”. A visão negacionista “pouco serve”, alerta, e “quanto mais tarde as empresas perceberem que têm de, efectivamente, entrar nesta jornada, maiores serão os custos” e maior a dificuldade em apanhar este comboio que segue, brinca, “a alta velocidade”.
“A sustentabilidade não é um fardo adicional”
Filipa Pantaleão, secretária-geral do BCSD Portugal, João Fonseca Santos, do Banco Europeu de Investimento (BEI), e André Themudo, da BlackRock, trouxeram três perspectivas diferentes ao debate. Esta última entidade, desconhecida por muitos, é considerada das maiores empresas de gestão de activos do mundo, especializada em investimentos globais. No fundo, presta serviços de consultoria para investimentos de risco e assume uma crescente integração dos critérios ESG nas suas estratégias. O painel de debate foi, por isso, elucidativo em relação ao posicionamento de diferentes agentes com papéis relevantes na implementação da sustentabilidade no mundo corporativo.
Filipa Pantaleão, cuja associação que dirige reúne empresas comprometidas com a sustentabilidade, partilhou que “as grandes empresas já estão noutra fase”. No entanto, e porque mais de metade dos associados do BCSD já são PME e porque, ao mesmo tempo, conhece a fundo o reporte sobre a maturidade das empresas em sustentabilidade, reforça que é fundamental amplificar a mensagem de que “a sustentabilidade não é um fardo adicional” para nenhuma empresa. Pelo contrário, “a sustentabilidade é eficiência”, assegura.
O Banco Europeu de Investimento (BEI) está fortemente comprometido com a sustentabilidade, ao apoiar, através de financiamento, projectos que estejam relacionados com a transição para uma economia verde. Espera-se que as suas práticas estejam alinhadas com os Objectivos de Desenvolvimento Sustentável e com as metas definidas pela União Europeia, direccionando os investimentos para energias renováveis, eficiência energética e inovação sustentável. João Fonseca Santos enfatiza, pois, “a promoção, coesão e integração europeias”. Sem descurar, no entanto, a importância de “capacitar todas as pessoas”.
Entre investidores privados e outras instituições, é “um tema fundamental”, o da sustentabilidade e critérios ESG. André Themudo fala em “empresas mais preparadas”, a longo prazo. É a conjugação das “forças societária, económica e reguladora”, acredita, que indicará o caminho para atingir as metas 2040-2050. No futuro, assegura também que “cada um de nós será responsável pela sua pegada”. O equilíbrio, esse, poderá alcançar-se através “do alinhamento entre organismos decisores e investidores privados”.
Nas notas finais da conversa (que pode rever aqui), o ênfase esteve no reporte de impacto e resultados da acção das empresas, de forma a antecipar as principais mudanças previstas para os próximos 50 anos e para a urgente necessidade de mudança de hábitos de consumo e da forma como vivemos em sociedade.
O futuro é circular?
O último dia dos Encontros com Futuro assinala o Dia Nacional da Sustentabilidade, 25 de Setembro. Desta vez, a iniciativa passa pelo Porto e o tema é a economia circular. Como orador principal, Fionn Ferreira. O comentário será assegurado por Mafalda Sarmento, da Universidade Católica Portuguesa, e o painel de debate, moderado pelo director do PÚBLICO, David Pontes, contará com os contributos de Pedro Norton de Matos, fundador do Greenfest, um dos maiores eventos nacionais sobre sustentabilidade, de Alice Khouri, da Helexia Portugal e fundadora da Women in ESG Portugal, e de Bruno Esgalhado, parceiro da McKinsey & Company. No final, haverá tempo para uma breve apresentação do Boil, o festival dedicado às alterações climáticas que arranca no mesmo dia em Serralves.